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R$ 1,50

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Tipo: Blog

Categorias: ilustração, textos

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Estava voltando da faculdade para casa já no final do noite, como parte da rotina de retorno desci na estação alto do ipiranga da linha verde e comecei a subir as escadas. Antes de existir a estação pinheiros da linha amarela, essa pra mim era a estação de metro mais funda com seus 4 lances de escadas e arquitetura mega exótica onde luzes verdes adornam a estação dando a impressão de estarmos em um filme de ficção cientifíca.

Subindo as escadas lentamente começo a ouvir uma voz de uma mulher levemente exautada. Cada escada ia ficando mais claro a conversa que ela tinha possivelmente com algum funcionário do metro. No ultimo lance de escada a situação ficou clara, terminei de subir e estava fazendo o contorno em volta do grande vão central para ir para saida e assisti a cena com mais clareza. Do lado de fora atraz das catracas uma moça provavelmente com problemas no seu bilhete único (é o que usamos para pagar a passagem aqui em São Paulo) estava querendo entrar no metro e do outro lado um funcionário do metro ouvindo a calmamente e dizendo que não podia entrar.

Fiquei olhando a cena e ao sair pela catraca, passei meu bilhete único na catraca em que a moça estava. A passagem se abriu e a moça ficou olhando para mim, sinalizei para ela passar e ela ficou com uma cara meio perplexa e passou rapidamente pro outro lado e eu segui indo embora. Como quem se esqueceu de algo, ela gritou do lado de dentro, “Valeu moço!” e assim nunca mais vi a moça ou o funcionário do metro.

Existe alguém errado nessa situação? Eu, a moça ou o funcionário? De verdade não sei. A moça que estava indignada com o funcionário pois ia perder o trem e ter que se virar para chegar em casa, o funcionário estava obedecendo a simples ordem de que não podia liberar a catraca para ninguém exceto em algumas ocasiões que não era aquela  e eu tava passando e resolvi ajudar a moça. Todos nós de certa maneiras tinhamos razão para estar por lá naquele momento.

Foi essa situação que me fez pensar no valor do R$1,50 que passei naquela catraca. Com R$1,50 que é o valor da passagem de estudante em São Paulo não dá pra fazer muita coisa. Se pensarmos no condução inteira que é R$3,00 também não dá muita coisa, talvez comprar uns dois drops ou um salgado e um suco de pó. Mas ao mesmo tempo é o valor que precisa para chegar na sua casa, é o valor que criou uma barreira entre o que podia e o que não podia ser feito. Foi o dinheiro que naquele momento e em tantos outros que separou as pessoas e as impediram de fazer o que queriam ou ter o que precisavam.

Ok, exagerado puxar essa situação como exemplo, mas naquele momento que me veio um monte de discussões que já tive sobre dinheiro. Um amigo me disse uma vez que ve o dinheiro como uma energia que precisamos, com essa energia agente pode fazer o que quiser, seja para nosso bem ou para mal.

De certa maneira essa energia que nós ajuda a trilhar nossos caminhos nesse mundo, algumas pessoas usam suas vidas pautadas nesses limites gerados pelos dinheiros. E ai vem as pirações de tenho que guardar dinheiro, tenho que ter dinheiro, preciso do dinheiro. E nesse momento de tantos precisos e quero que me vem a mente o pensamento de Vilam Flusser sobre o nosso mundo codificado.

Vivemos em um mundo baseado em códigos, transmitimos mensagens o tempo inteiro, por olhares, gestos, palavras, textos, videos, e varias outras formas. Essas mensagens são mundos pararelos, foram criados por nós e não fazem parte da realidade, esses códigos analisando friamente não tem poder sobre nossas vidas. Se falamos algo não necessariamente aquilo irá acontecer. E nesse mundo de códigos e sinais, o dinheiro é mais um elemento, criados por nós com um valor imaginário associado.

Realmente não sou contra o dinheiro, muito menos contra o consumo ou venda de coisas, mas eu acredito que nossas relações com esses mundos precisam ser pensadas. Existem outras coisas que estão no mundo e que são bem maiores que valores monetários, que existem em uma realidade mais tangivel, essas coisas existem no mundo das relações. Nós vivemos nesse mundo, e não somos presos a essas realidades criadas pelo valor do dinheiro. O dinheiro entra nessa mundo para criar uma especie de jaula que nos dita nossos limites, mas o que não percebemos muitas vezes é que o dinheiro é apenas um fluído. Ele está sempre ai circulando, não devemos tentar para-lo, muito menos guarda-lo pois se não apenas morreremos afagados.

Um comentário em “R$ 1,50

  1. Acredito que além de toda essa codificação em que vivemos, nos falta a simplicidade da boa vontade…a que você teve, por exemplo….a valorização do que realmente vale a pena e faz sentido….Dinheiro é bom sim, mas o valor do alivio daquela moça ao poder ir embora, a ‘resolução’ do problema para o funcionário e a sua satisfação em ajudar, não há dinheiro que possa comprar….Adorei seu texto…

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